Por onde a humanidade sangrou, ele passou. Não como turista da desgraça, mas como testemunha comprometida. Sebastião Salgado não se limitou a fotografar pessoas. Ele eternizou histórias que o mundo tentava esquecer.
Por décadas, Sebastião Salgado percorreu os cantos mais esquecidos do planeta com uma câmera na mão e um propósito no coração: revelar a condição humana em sua forma mais nua e crua, o ex-economista transformou o fotojornalismo ao torná-lo um ato de consciência global.
Com três projetos monumentais — Trabalhadores (1993), Êxodos (2000) e Gênesis (2013) — Salgado criou o que muitos chamam de sua trilogia da condição humana. Mais do que fotografias, essas obras são documentos históricos. E, acima de tudo, são gritos.
O primeiro grito veio com Trabalhadores, uma série que percorreu o mundo industrial e rural em busca da essência do esforço humano. Nas minas de ouro de Serra Pelada, nos engenhos de açúcar, nas fábricas asiáticas. Salgado revelou rostos cobertos de suor, mãos calejadas e corpos forjados na dureza do trabalho.
Mas o foco nunca foi o sofrimento em si. Salgado buscava a dignidade. “Essas pessoas mantêm o mundo em movimento”, afirmou ele certa vez. Com seu preto e branco dramático, composição meticulosa e luz quase divina, ele conferiu grandeza a quem o sistema insiste em invisibilizar.
Em Êxodos, o fotógrafo ampliou sua lente. Viajou por mais de 40 países para capturar a maior tragédia social do século XX: os fluxos migratórios causados por guerras, fome, pobreza e perseguições. O resultado foi um retrato contundente e doloroso do deslocamento humano.
Foram sete anos de registros. Crianças dormindo sobre lonas, mães cruzando desertos com filhos nos braços, campos de refugiados sob bombardeio emocional e real. Cada imagem de Êxodos é um apelo. Um convite à empatia. Uma visão de que fronteiras políticas nunca impediram a dor de atravessar.
A natureza ainda vive
Após documentar tanta dor, Salgado se voltou para a beleza. Não por escapismo, mas por necessidade. Gênesis, lançado em 2013, é um tributo à natureza intocada e aos povos que vivem em harmonia com ela. São imagens de uma Terra que ainda resiste, gelada, úmida, selvagem, pura.
Da Sibéria à Amazônia, do Saara ao Alasca, Salgado registrou animais em liberdade, tribos isoladas, paisagens intocadas. Não como um catálogo turístico, mas como um alerta: o planeta ainda é lindo. E pode continuar sendo, se agirmos a tempo.
Sebastião Salgado em parceria com sua esposa Lélia Wanick Salgado, fundou o Instituto Terra, um projeto de restauração ecológica que já recuperou mais de 2,7 milhões de árvores na Mata Atlântica. Uma antiga fazenda de gado virou floresta.
O projeto virou referência mundial em reflorestamento e educação ambiental. Salgado, que por anos retratou a destruição, passou a plantar esperança, literalmente.
As obras de Salgado já foram exibidas em mais de 40 países e vistas por milhões de pessoas. Livros como Êxodos e Trabalhadores venderam centenas de milhares de cópias. O documentário O Sal da Terra, dirigido por Wim Wenders e Juliano Ribeiro Salgado, foi indicado ao Oscar e emocionou plateias ao redor do mundo.
Em 2021, Salgado foi eleito membro da Academia de Belas Artes da França, o segundo fotógrafo a receber essa honra. Mas talvez seu maior prêmio seja outro: ter transformado a fotografia em consciência.